domingo, 7 de setembro de 2014

Ponta Porã Linha do tempo: Causos e lendas do folclore da fronteira. Hospital Santa Isabel nos tempos de Secundino.

*Yhulds Giovani Pereira Bueno

   Fronteira de tantas histórias de épocas passadas, distintas e cercadas de acontecimentos, mas sempre rodeados fatos incomuns, se comparados aos dias de hoje.

   Causos são contos repassados de pai para filho, de uma geração para outra geração, contado na roda de amigos tomando um bom chimarrão (mate) ou um saboroso tereré, causo é contado com um ar de mistério, mas preservando a verdade da lenda e respeitando sempre a memória cultural das famílias fronteiriças.

   Causo (conto) ou lenda já era utilizada pelos povos antigos de outras eras, para repassar seus conhecimentos suas histórias e assim seguir mantendo sempre viva suas origens e crenças. Vamos abordar um de muitos causos que são contados pelos antigos na região de fronteira.

   Hospital Santa Isabel se localizava onde hoje está instalado o CRE Centro Regional de Especialidades Drº João Kayatt entre os cruzamentos da Rua Guia Lopes e Rua Felisberto Marques. Em outras épocas o Hospital Santa Isabel era o porto seguro daqueles que necessitavam de tratamento médico, mas nem sempre todos conseguiam se curar de suas enfermidades, e óbitos ocorriam neste local, sempre gerando muita historia de aparições e ruídos pelos corredores, isso contado pelo povo em outros tempos.

   De acordo com relatos de quem conviveu escutando esses causos, Secundino era um senhor que trabalhava no Hospital Santa Isabel uma figura um tanto folclórica pelos seus hábitos, atitudes e jeito de falar, dentre suas várias atribuições, uma em especial chamava atenção, o senhor Secundino tinha a responsabilidade de cuidar dos corpos (defuntos), levando os mesmos até a capela mortuária (necrotério) para ser preparado para o sepultamento, neste período histórico essa capela mortuária se localizava ao lado do hospital, a mesma era de madeira, hoje neste local existe uma capela mortuária de material (alvenaria). 

   Para chegar até a capela mortuária tinha que fazer uma grande volta por fora do hospital, como neste tempo pouca iluminação existia, Secundino preferia fazer um caminho mais curto, que era por dentro do hospital, mas no final do corredor existia uma janela e não uma porta de ligação com a capela mortuária, impedindo que algo passasse por ali, mas para Secundino isso não era empecilho, pois ele segundo a história (causo) repassado amarrava os defuntos e passava os mesmo pela janela, isso gerou muitas historias na época, pois quem eventualmente por ali passava e observava tal acontecimento no meio da escuridão, logo imaginava que o defunto estava pulando a janela, não diferente os enfermeiros e médicos que não conheciam as proezas de Secundino, se assustava quando se deparava com tais fatos um tanto fora do comum, mas para os médicos destes tempos como: Dr° José Issa, Drº Nery Azanbuja, Drº Teixeira, Drº José de Simone, e demais médicos da época (in memorian), estes fatos  não era novidade e nem assustadores se tratando de Secundino, figura caricata na sua maneira de se portar.

Foto arquivo família Puléo: Dº Joaquim Teixeira médico renomado em seu tempo na fronteira e sua esposa Felícia Arguelho Teixeira.

   Um causo um tanto atípico dentre tantos chamou atenção, conta história se é verdade a mesma está gravada no imaginário dos populares vivos destes tempos, que certa vez um óbito ocorreu e o corpo que não fora identificado por ninguém, o mesmo seria enterrado como de costume nesses casos como indigente (pessoa não identificada), Secundino era responsável por levar os corpos ao cemitério, esses eram levados de carroça (veículo puxado à tração animal) nesses tempos, como já era tarde e a noite já estava chegando, Secundino saiu às pressas o caminho era longo e cheio de curvas, e além de tudo existia nesses tempos onde hoje se localizam Rua General Ozório, Rua Calógeras e travessa Rua Dep. Aral Moreira, uma imensa erosão (buraco) muito íngreme com um pequeno córrego, chamado nesses tempos de terra de ninguém, era rodeado de mata e poucas casas, esse buraco dificultava a travessia da carroça, como o cemitério Cristo Rei se localiza na Rua Rio Branco e Rua Cosme Damião (o mesmo permanece no mesmo local até os dias de hoje), era muito longe com um grande vassoural (planta nativa da região) e guavira (planta frutífera nativa da região).

  O caminho era longo pela dificuldade naqueles tempos, mas Secundino não queria perder a hora, pois para completar o tempo estava fechando e isso significa chuva na certa, o desespero de Secundino fora tal que quando contornava o buraco bem na encosta no mesmo para atalhar caminho o caixão com defunto dentro caiu e deslizou ladeira a baixo, Secundino em meios a trovoadas, chuvas e os solavancos da carroça nem percebeu que perdera o caixão com defunto, só percebendo o que tinha ocorrido quando chegou ao cemitério, pois lá se encontrava o zelador da época o senhor conhecido de todos como por seu Dindin, que logo foi questionando Secundino onde estava o caixão e o defunto que seria enterrado.

   Secundino voltou ao hospital e relatou o acontecido, como já era noite e estava chovendo o caixão e o defunto só seriam procurados pela manhã, segue causo que até ajuda do quartel (exército) fora solicitado e disponibilizaram alguns soldados para as buscas, populares da época também ajudaram para localizar o caixão.

   Pois não fora fácil achar o defunto fujão no meio da chirca (planta daninha) e da mata, que pelo jeito teimara em ser sepultado como indigente, ficando assim mais um entre tantos causos do Secundino na região, hoje já esquecido pelas décadas e novas gerações, mas sempre vivo na memória do povo de outras épocas saudosas da nossa região de fronteira.

   O resgate de eventos históricos, causos ou lendas é uma forma de manter viva na lembrança momentos que de uma maneira ou outra marcaram uma época.

Pesquisador: Yhulds Giovani Bueno. Professor de qualificação profissional, gestão e logística (Programas Estaduais e Federais). Professor da Rede Coordenador Municipal de Educação. Membro do Grupo Xiru do CTG – Querência da Saudade – Ponta Porã – MS.


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